BAHIA
Mais do que pedidos, conheça os sentidos que as fitinhas do Bonfim carregam
Conheça a origem de importante tradição baiana
Por Aurélio Leal e Evelin Medeiros

Elas estão nos pulsos, nos portões da Basílica, nas ruas do Pelourinho e até em vitrines pelo mundo. Pequenas, coloridas e simbólicas, as fitinhas do Senhor do Bonfim fazem parte do cotidiano da Bahia e da memória afetiva de milhões de pessoas. Mas o que pouca gente sabe é que, por trás dessas tiras de tecido, existe uma história rica que mistura religiosidade, resistência cultural e transformação social.
A origem remonta a 1809, no contexto da Irmandade do Senhor do Bonfim, uma das mais antigas e influentes confrarias católicas da Bahia. Na época, as fitinhas não eram vendidas em massa nem associadas diretamente a pedidos e promessas. Eram chamadas de “medidas”, porque tinham exatamente 47 centímetros, a distância do coração à mão esquerda da imagem do Senhor do Bonfim. “Ela era chamada de medida e foi criada como uma forma de devoção ligada ao corpo da imagem do Senhor do Bonfim”, explica o padre Edson Menezes.
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As fitas eram usadas como relíquias. Eram costuradas nas roupas, penduradas no pescoço com medalhas ou cruzes, e faziam parte dos rituais e da proteção espiritual dos devotos. Com o tempo, a prática foi se adaptando. As medidas passaram a ser amarradas nos gradis da Igreja, como gesto simbólico de fé, e se popularizaram entre fiéis, turistas e moradores. Hoje, estão em todo lugar, nas ruas de Salvador, nos trios elétricos, nas malas de viagem e até em grandes centros urbanos fora do país.
Mas mais do que um objeto de fé católica, as fitinhas representam um dos maiores símbolos do sincretismo religioso baiano. Embora associadas ao Senhor do Bonfim, que, na tradição do candomblé, é identificado com Oxalá, as cores das fitas dialogam diretamente com os orixás e com os rituais das religiões de matriz africana. “Cada cor tem um orixá. Azul é Ogum, a vermelha é Iansã, a amarela é Oxum”, explica Vera Lúcia Aliane, Iá do Terreiro de Tupinambá.
Essa sobreposição de significados ajuda a entender por que as fitas resistem há mais de dois séculos. Elas não apenas sobrevivem: se reinventam. São sinal de devoção, objeto de identidade cultural e, ao mesmo tempo, produto turístico. Essa dualidade provoca debates entre tradição e mercado. Atualmente, fitas estilizadas são vendidas em lojas de moda, incorporadas a acessórios e comercializadas como lembranças em diferentes idiomas.
Além disso, muitas famílias vivem há gerações da venda das fitinhas. Nas escadarias do Bonfim, Cleo é uma dessas figuras. Começou a vender aos 10 anos, influenciado pela mãe e pelos irmãos. Hoje, aos 50, continua sustentando a família com o ofício. “Se você fizer seu pedido com fé, você alcança”, afirma. A frase é simples, mas ecoa o que talvez seja o coração da história: fé e esperança como forças que atravessam o tempo.
No novo vídeo do A Tarde Play, a reportagem percorre esse caminho. Vozes distintas ajudam a traçar o percurso dessas fitas, de relíquia a lembrança de viagem, de devoção a identidade cultural.
Assista ao conteúdo e conheça por completo os significados e as transformações por trás de um dos maiores símbolos da cultura baiana.
Veja o vídeo:
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